Seu Gerente Não é Seu Amigo

Desculpe, mas preciso te dizer uma coisa:

O gerente do seu banco não é seu amigo.

Pronto, já disse.

Sei que isso será um choque para alguns.

Outros podem estar se perguntando: isso não é óbvio?

Nesse caso, minha resposta seria: não, não é!

Nós, brasileiros, frequentemente agimos como se os nossos gerentes fossem nossos melhores amigos e, dessa forma, nunca nos indicariam algo que não fosse o melhor para nós.

Ele nunca ofereceria um produto sabendo que não é o mais adequado para nosso perfil ou nossa necessidade.

Um amigo nunca esconderia os detalhes ruins das “grandes oportunidades” que ele está apresentando.

Um amigo sempre nos diria a verdade.

Ou seja, como um grande amigo, ele estaria preocupado com o nosso bem-estar e o nosso sucesso e só apresentaria oportunidades financeiras que fossem boas para nós.

Infelizmente, esse não é o caso.

E para evoluirmos como investidores, precisamos entender, de uma vez por todas, o que gerente de banco realmente é: um vendedor.

Ele é um vendedor e nós somos os seus clientes.

O seu objetivo é vender, e ele fará isso usando todas as técnicas de venda disponíveis.

Ele, como qualquer outro vendedor, irá destacar todas as qualidades daquele produto que deseja negociar e, ao mesmo tempo, minimizar, ou mesmo esconder, os problemas que o produto possa ter.

Ele nunca, nunca, dirá pra você que existem melhores produtos financeiros fora do seu banco.

Infelizmente, construímos no Brasil uma relação entre consumidores e bancos que nos faz tratar essas empresas financeiras de uma forma diferente daquela que tratamos todos os outros fornecedores de produtos.

Vejamos, como exemplo, o comportamento natural de um consumidor na aquisição de um carro.

Inicialmente o consumidor identifica a necessidade ou interesse de adquirir esse carro. A partir desse momento, ele começa a delimitar as características do carro que atenderiam às suas necessidades, como o seu tipo, potência do motor, tamanho, fabricante, ou mesmo qual a marca do veículo.

Feito isso, o consumidor procura um fornecedor, nesse caso, uma concessionária de veículos.

Ao fazer isso, esse cidadão é recebido por um corretor de veículos, um vendedor.

Esse vendedor irá apresentá-lo os produtos que estão disponíveis em sua loja, tentando combinar as características desses produtos com as suas necessidades e interesses.

Ao apresentar esses produtos, ele irá destacar muito fortemente todas as suas vantagens e não irá mencionar, ou irá minimizar, suas desvantagens.

Mas você, consumidor consciente, buscará extrair do vendedor todas as informações do veículo.

Você perguntará sobre o seu consumo, que pode ser alto. Perguntará sobre o preço das revisões, sobre a sua segurança, sobre a garantia, etcetera e etcetera.

Em especial e, no mínimo, você perguntará o preço do carro.

Óbvio, não?

Afinal de contas, você nunca compraria um produto sem perguntar o seu preço, correto?

Daqui a pouco, voltarei a essa questão.

Pois bem.

Munido de todas essas informações, você irá comparar esse veículo com outros, da mesma loja ou de outras.

Assim, você finalmente tomará a decisão por qual produto adquirir.

Vejamos agora o comportamento natural de um brasileiro ao adquirir um produto financeiro, um investimento.

Você identifica o interesse de investir.

Você procura o gerente do seu banco.

Muitas vezes, aliás, você nem precisa fazer isso. O próprio gerente, ao identificar que você possui dinheiro “parado” em sua conta, entra em contato com você para oferecer algum investimento.

Nesse momento, o gerente apresenta as características daquele produto, mostrando o quanto ele é “interessante”.

Só que, diferentemente do seu comportamento quando está comprando um carro, nesse caso, o consumidor não considera o gerente como um vendedor e aceita sua recomendação sem qualquer contestação.

Ele não busca obter todas as informações sobre o produto, e nem se preocupa em comparar esse produto com aqueles de outros bancos.

E, pasmem, normalmente nem sequer perguntam o “preço” do produto.

E, como qualquer produto, investimentos financeiros também têm um preço.

Esse preço é materializado como taxa de administração, taxa de custódia, taxa de carregamento, taxa de saída, taxa de performance, taxa de corretagem, entre outras.

E, acreditem, existem produtos financeiros caros, aliás, muito caros, e produtos financeiros baratos.

Façamos neste momento uma autocrítica.

Você tem um plano de previdência privada?

Se sim, você sabe o quanto pagou de taxa de carregamento? Você sabe o quanto paga anualmente de taxa de administração? Você sabe se terá que pagar taxa da saída?

Se sua resposta foi “não” para qualquer uma dessas perguntas, você paga por um produto sem saber o seu preço.

E me desculpe ser portador de más notícias, mas, se você tem um plano de previdência privada por um grande banco comercial, você provavelmente tem um produto muito caro e de baixa qualidade (assunto para um outro artigo).

Dicas práticas:

  • Se você possui um plano de previdência privada e não sabe as taxas que está pagando procure imediatamente o seu banco para buscar essa informação.
  • Felizmente, existe a possibilidade de realizar a portabilidade desse planos, nos mesmos moldes da portabilidade de planos de telefonia móvel. Com essa informação, procure outras instituições bancárias e compare as taxas.
  • Se for interessante, migre seu plano para outra instituição.
  • Considere ainda resgatar os recursos do plano de previdência e aplicar diretamente em investimentos adequados para acumular patrimônio no longo prazo (como o Tesouro IPCA+, que possui rentabilidade atrelada à inflação). Mas, nesse caso, avalie com muito cuidado as penalidades que você terá que pagar por esse resgate (como taxa de saída e imposto de renda), pois pode não valer a pena fazer isso.

Mas, vamos continuar.

Você investe em um fundo de investimento? Sabe o quanto paga de taxa de administração? Você sabe se paga taxa de performance? De quanto?

Mas a situação pode ficar pior.

As instituições financeiras brasileiras (bancos e corretoras de investimentos) oferecem alguns produtos comuns, como os títulos públicos do tesouro nacional.

Esses títulos não pertencem à essas instituições, e sim ao governo federal.

O papel dessas instituições é somente repassar esses títulos, como lojas diferentes vendendo o mesmo produto.

Pois bem, a diferença de preço cobrado pelas instituições pelo trabalho de repasse desses produtos é absurdamente grande.

Algumas instituições cobram ZERO. Isso mesmo, nada.

PS.: E antes que você se pergunte sobre como isso é possível, informo que essa é uma estratégia de várias corretoras de investimento para captar novos clientes. Assim, elas poderão apresentar a esses clientes outros produtos financeiros pelos quais serão remuneradas.

Outras instituições cobram 0,5% anualmente por todo capital investido.

Isso significa que uma pessoa com um investimento de 10 mil reais irá pagar 500 reais anuais para um banco, quando poderia não pagar nada.

E, é importante lembrar, essa enorme diferença de preço é pelo mesmo produto.

Dicas práticas:

  • Se você possui investimentos em títulos públicos, a boa notícia é que também é possível realizar a “portabilidade” desses títulos. Esse processo é conhecido como “transferência de custódia”.
  • Se não tem essa informação, procure saber no site do tesouro direto ou junto à sua instituição financeira a taxa de custódia que você está pagando. Independente de instituição, todo investidor precisa pagar uma taxa de custódia à BM&FBovespa, no valor de 0,3% ao ano. Além dessa taxa, cada instituição cobra sua própria taxa de custódia, que varia de 0 à 0,5% ao ano (como já expliquei anteriormente). Assim, é possível transferir a custódia de seu investimento para uma instituição que não cobra taxa de custódia.

Voltando ao tema.

E quem cobra as maiores taxas? Quem tem os maiores preços em seus produtos financeiros?

Os grandes bancos comerciais.

E por que nós consumidores aceitamos essas taxas?

Porque consideramos que o nosso gerente não nos apresentaria um produto financeiro ruim.

Afinal de contas, um amigo não faria isso, não é?

Jerffeson Teixeira de Souza, Ph.D.
Fundador e Editor do Blog “Meu Educador Financeiro”

 

 

3 comentários

  1. Identifiquei-me com a situação, especificamente com as relacionadas às previdências privadas de grandes bancos comerciais.
    Tenho um dinheiro aplicado em PGBL e até hoje desconhecia algumas taxas especificas. Na verdade, dei maior prioridade em saber sobre o imposto de renda relacionado ao investimento.
    Obrigada pela oportunidade de saber mais e rever meus conceitos sobre minhas aplicações.
    Parabéns pelo artigo!

    1. Obrigado pelo comentário Júlia.

      A estratégia de comercialização do PGBL é sempre essa, destacando o imposto de renda que “você deixará de pagar”. O que o gerente não deixa claro é que na verdade não há isenção de IR, somente um adiamento, e que você poderá acabar pagando muito mais, até 35%, no caso da tabela regressiva, caso você precisa retirar o dinheiro antes de 2 anos. Também não são mencionadas as outras taxas (carregamento, saída e administração).

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